quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

O Taxista

Imaginem que droga ser um taxista esquizofrênico. Imaginem o prejuízo do coitado, pegando passageiros imaginários por aí. Imaginem a cena: o táxi para, entra uma linda mulher e o motorista arranca. Como de praxe, puxa conversa:
- Para onde, senhora?
- Senhorita...
- E onde fica isso?
- Não, eu apenas lhe corrigi. Sou senhorita, não senhora.
- Ah, me desculpe. Eu nunca sei a diferença. E onde a senhorita quer ir?
- Deixe que eu vou lhe guiando. Dobre aqui.
- Certo. A senhorita é muito bonita...
- Obrigado. Eu sou a sua idéia de mulher ideal.
- E é mesmo. – dá uma piscada para a moça. Mais bonita que minha mulher.
- Entre nesta rua.
- Ok. E o que uma senhorita tão bonita faz da vida?
- Olha... Na verdade eu sou um fruto da sua imaginação...
- É mesmo? E isso dá dinheiro?
- ... – só faz uma careta, revirando os olhos. Quanto você imagina que eu ganho?
- Olha, senhorita, não faço idéia.
- Pois é exatamente isso que eu ganho.
O motorista só coçou a cabeça.
- E o que a senhorita faz na rua uma hora dessas da madrugada?
- Diga-me você, eu estou só na sua cabeça. Aqui, faça o retorno.
- Ok. Mas como assim, na minha cabeça?
- Eu não existo, você está me imaginando.
- Mesmo?
- Sim, e cuidado com este pé de bergamota no meio da rua?
- Que pé de... Puta merda! – e desvia quase em cima da planta. O que era aquilo?
- Bergamota. Já comeu?
- Sim, mas...Não! Digo, o que raios elas faziam no meio do asfalto.
- É... Na verdade elas não estavam lá. Eram também frutos da sua imaginação, entende?
- Frutos é? Da minha imaginação...?
- É.
- Sei... Minha imaginação tem um senso de humor bem primário, pelo jeito. Que trocadilho ridículo.
- Pois é... Mas lembre-se, a mente é sua. E tudo que eu lhe digo é você que está criando.
Aqui nosso motorista segue dirigindo, mas toma uma pausa para reflexão. Logo volta ao diálogo com o fruto da sua imaginação:
- Mas se você é somente um fruto da minha imaginação, para onde está me levando? E, meu Deus, não há outro termo para designar a sua essência do que “fruto da minha imaginação”, ou “senhorita”? O leitor já deve estar exausto.
- Não, não há.
- Puxa, que falta de criatividade.
- Pois é. Sua.
- Bom, enfim... Para onde você está me levando?
- Você deveria saber, eu não estou aqui na realidade.
- Droga, então estou perdido.
- Está nada. Se olhar em volta, verá que nem saiu do lugar.
- Hmm... É verdade...
- Bom, vou descer por aqui mesmo... Tome este dinheiro imaginário.
- Aqui está o seu troco.
- Deixe de ser idiota.
- Ah, sim, claro. Você não existe. Nem este dinheiro.
- Outra coisa... Você comentou sobre sua mulher antes... Na realidade, a sua mulher...
- O que tem ela.
- Não sei se devo dizer...
- O que??? Me fale!!!
- Ela também não existe.
- Como assim??? Tá brincando???
- Não, é sério...
- Não acredito!!! Então por que ela não é mais gostosa:
- Pois ela é o perfil de mulher com quem você sempre imaginou que acabaria casado. Aliás, muita gente que você acha que conhece, não existe...
- Ai meu Deus! Sério???
- Sim.
- Quem, por exemplo?
- Bom, já vi que vai ser uma longa madrugada. – e entra de volta no táxi. Vou lhe contar. Siga por esta rua e dobre à esquerda na próxima...
- Certo. Mas olha... Eu posso “guiar” com o carro desligado? Assim não gasto gasolina.
- Olha, querido, como este seu carro também não existe, faça como preferir...

Um comentário:

Guile Grossi disse...

certo que ele acordou numa banheira de gelo sem o rim.